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''A Rodada Doha vai para o beleléu''

Data: 13/05/2010 00:00

Roberto Rodrigues concedeu entrevista ao Estadao e disse que o Brasil precisa se preparar para uma tendência mundial que ele chama de neoprotecionismo.

Confira a matéria na íntegra.

José Maria Tomazela, SOROCABA

Segunda-Feira, 09 de Fevereiro de 2009

O Brasil vai produzir menos grãos nesta safra agrícola. Isso poderá prejudicar também a producão em 2010, que seria ainda menor, provocando o risco de uma disparada no preco de alimentos e da volta da inflacão. Na avaliacão do ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, atual presidente do Conselho do Agronegócio da Federacão das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o governo pode interferir nesse cenário com medidas imediatas para garantir precos mínimos e assegurar a oferta de crédito para o produtor. Ele lembra que o Brasil precisa criar instrumentos para proteger a sua producão, como outros países estão fazendo, para não ser 'comido pelos outros ', o que chama de neoprotecionismo. Em entrevista ao Estado, ele defende a regulacão do sistema financeiro que, em vez de apoiar a producão, transformou-se num 'mecanismo de gerar dinheiro '.

O agronegócio brasileiro é altamente dependente de crédito, hoje escasso. Como garantir o financiamento da producão?

Precisa haver uma regulacão do sistema financeiro, que perdeu a rédea. Ao invés de ser instrumento de desenvolvimento e emprego e de apoiar a producão, transformou-se em mecanismo de gerar dinheiro. O mundo inteiro quer uma nova regulamentacão. Minha hipótese é de que o G 20 (grupo dos principais países em desenvolvimento mais os países ricos) poderia ser o fórum para isso. Tem de ser uma coisa negociada. Não acredito numa regulacão do sistema financeiro no curto prazo.

O setor pode tirar alguma licão da crise?

O que a crise gerou no mundo todo foi o que chamamos de neoprotecionismo. Os países estão defendendo seus governos e fazendo protecão clara e ostensiva da sua producão. Essa nova fase tem duas vertentes relevantes: a primeira é que esse movimento vai contra a globalizacão da economia e fragiliza as grandes instituicões mundiais, como a ONU e a OMC. Acredito que a Rodada de Doha (negociacões para reduzir as barreiras comerciais) vai para o beleléu. Como fazer uma rodada de liberalizacão num cenário desses? Outra vertente é que, se todo mundo está se protegendo com todas as armas disponíveis, o país que não se proteger será comido pelos outros. É preciso encontrar os meios para isso.

Com a crise a esta altura já consolidada, os efeitos na agricultura estão mais definidos?

Na agricultura brasileira, estamos vivendo uma situacão complicada. Na agricultura de grãos, os custos subiram espetacularmente e o crédito diminuiu em relacão à demanda por hectare. Os agricultores reagiram plantando menos e com menor tecnologia. A safra de grãos, por essa razão, será menor este ano. A esse fator determinado e certo, somou-se a seca: estados com grande producão, como Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio Grande do Sul, tiveram quebras de até 25%. A safra, além de tudo, será pequena em razão desses fatores: custo elevado, pouco crédito e baixa producão.

Qual a tendência para os precos que remuneram o produtor?

Os precos são uma incógnita. Minha tese é que não deveriam cair mais. Os bons fundamentos continuam presentes, como os baixos estoques mundiais e a demanda aquecida. O problema é que a crise parece crescer em direcão aos emergentes. Se isso acontecer, a renda cai e seria um desastre para a agricultura. Mas é só na agricultura, pois vai haver alimento e não haverá inflacão.

Fala-se também em queda nas exportacões agrícolas este ano.

A previsão de queda de 27% nas exportacões é do Ministério da Agricultura. As exportacões de derivados da cana-de-acúcar, laranja e carnes também estão sofrendo e, segundo os analistas, devem cair este ano em percentuais que variam de 12% a 28%. Além da falta de crédito para exportacão, os ACCs (Adiantamentos de Contratos de Câmbio), os mercados ficaram mais limitados e exigentes. Sem conseguir vender, a indústria - usinas, frigoríficos e fabricantes de suco - repassa o problema para o produtor, que não aguenta. O pecuarista, o produtor de cana e de laranja estão quebrando.

Há risco para a economia do País?

O grande risco para o Brasil não é a queda nas exportacões. Elas são importantes, mas não são determinantes para a economia ir bem. O País não vai deixar de crescer por exportar menos. A sociedade não será afetada de forma dramática. O problema é o produtor, ele sim, será afetado. Se o produtor não fizer uma boa safra este ano, vamos ter producão ainda mais baixa em 2010. Aí, a sociedade será afetada. Não vai haver oferta para atender à demanda e os precos podem disparar, trazendo inflacão.

Frente a esse quadro, o que pode ser feito?

Considerando essas variáveis, precisamos criar imediatamente medidas de protecão para isso não acontecer. O recálculo dos precos mínimos, em bases reais, deve ser imediato. Está na lei: se o preco do mercado cai abaixo do mínimo, o governo pode agir para garantir a renda do produtor e dar seguranca ao sistema de crédito. Com uma safra grande este ano, teríamos muito para exportar no ano que vem, sem inflacão e com garantia de saldo comercial espetacular. O governo precisa resgatar os precos mínimos, dar ao produtor crédito à vontade para exportacão, através dos ACCs, e assegurar capital de giro para o produtor ter condicão de estocar, principalmente as usinas que produzem em oito meses para vender em doze.

 

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